quarta-feira, 31 de julho de 2013

Menos erudição e mais tesão

Não é de hoje que me incomodo com o excesso de erudição, representado para mim na tendência de algumas pessoas de se encherem de conhecimento e, apesar disso, não serem capazes de viver com plenitude a experiência proporcionada pelos sentidos. É o caso dos especialistas em vinho que parecem ter esquecido que, para um sujeito comum, beber algo simplesmente gostoso na companhia de amigos ainda é o mais importante. Ou de quem busca entendimentos racionais e definitivos para a arte (em qualquer de suas expressões) e não consegue se deixar levar pela emoção espontânea, genuína e aparentemente desmotivada.

Agora encontrei guarida para meus pensamentos no livro Variações sobre o Prazer (Editora Planeta), de Rubem Alves, pedagogo, cronista, ensaísta e outras tantas coisas. Por meio da obra de Santo Agostinho, Nietzsche, Marx e Babette (isso mesmo, a cozinheira de A Festa de Babette), o autor trata da necessidade de viver com sabedoria, que ele define como a arte de degustar a vida. Para isso, propõe, é preciso se libertar de uma infinidade de "coisas tolas e mesquinhas", entre elas o academicismo, o conhecimento que se encerra nos limites rígidos do formalismo.

Em entrevista recente a O Estado de S. Paulo, Rubem Alves fala de sua decisão de trocar os saberes (conhecimento formal) pelos "sabores", o saber com gosto, alegria e prazer. "Precisei, primeiro, libertar-me das regras do discurso acadêmico. E isso aconteceu não por uma decisão pensada, mas pela minha experiência com a minha filha pequena", afirma.

Por isso mesmo, a criança ocupa papel central no pensamento de Rubem Alves. A criança e a seriedade que demonstra no ato de brincar (conceito que traz de Nietzsche), sua curiosidade, elemento essencial para o aprendizado com prazer, e sua capacidade de enxergar a vida com uma imensa e constante provocação.

Dito tudo isso, Rubem Alves não despreza a importância do conhecimento. Ele é ferramenta, é o que dá a cada um competência para buscar a sabedoria. A ciência é um desses instrumentos. Mas ele alerta, também em entrevistas, que muitos cientistas não têm nada de sábios. A receita parece vir mesmo de Babette: "O que cozinhar? Essa decisão inicial exige um conhecimento que não se encontra em livros. A cozinheira tem de ser uma adivinha: precisa conhecer o desejo de quem vai comer", escreve o autor em seu delicioso livro.

Sem curiosidade, não há solução


Aidan Dwyer está ficando famoso em todo o mundo. O estudante americano de 13 anos inventou um mecanismo que aumenta a eficiência da captação de energia solar entre 20% e 50%. Para isso, não partiu de conhecimentos complexos, acessíveis a poucos. O motor de tudo foi a curiosidade.

Nas construções que utilizam energia solar, os painéis são dispostos horizontalmente. Instigado pelo mecanismo utilizado pelas árvores para absorver luz solar, Dwyer passou a buscar formas diferentes de organizar os painéis. Ele montou em um suporte tubular vertical, com pequenos painéis nas extremidades (veja foto abaixo).

Assim, Dwyer criou uma estrutura em que os painéis de capitação da luz do sol foram organizados como folhas em galhos. A invenção funcionou tão bem que lhe rendeu o prêmio de Jovem Naturalista, concedido pelo Museu Americano de História Natural, uma das mais importantes instituições de ensino e pesquisa dos EUA. Os testes com a invenção mostram que, comparada aos formatos tradicionais, a árvore solar de Dwyer é muito mais eficiente, até mesmo em épocas de menor incidência solar, como o inverno. Por ser vertical, a estrutura não é enterrada pela neve e também é menos prejudicada pela chuva.

As reportagens sobre o feito do menino rodam o mundo e já há empresas interessadas em fabricar em grande escala e comercializar a árvore solar. Um projeto que foi apresentado pela primeira vez na feira de ciências da escola.

A história Dwyer não é só inusitada; é emblemática. A curiosidade diante do desconhecido, disparada pela observação do mundo ao redor, é a marca fundamental dessa descoberta. É um lembrete contundente da importância de estimular as crianças a perguntar, seja lá o que for, e, acima de tudo, não deixar que dogmas sirvam de limitador para a capacidade natural do ser humano de questionar, investigar, estudar e ampliar seus horizontes.

Receita de menino-bolha

Todo mundo que tem hoje mais de 40 anos provavelmente se lembra de O Menino da Bolha de Plástico, de 1976. Com o então novato John Travolta, o filme, baseado em uma história real, marcou época à sua maneira, um tanto piegas, ao contar a trajetória de um garoto que nasceu com uma deficiência rara do sistema imunológico e cresceu dentro de uma bolha de plástico, protegido dos microrganismos que ameaçavam sua vida.

Aos olhos de uma boa parcela dos pais contemporâneos, as ameaças hoje parecem se multiplicar em centenas de formas diferentes e eles, às vezes sem perceber, criam para seus filhos
bolhas de plástico capazes de durar muitos anos. Na semana passada mesmo, o Destak publicou matéria sobre condomínios que estão multando quem fala palavrão. A motivação: proteger as crianças desses termos perigosos ditos em voz alta. “Fica chato para quem mora aqui ter de ouvir palavrões ao lado dos filhos”, argumentava um condômino.

Fica chato ou dá trabalho? Educar um filho é, em grande parte, ajudá-lo na tarefa de travar contato com o mundo que o cerca ou, em outras palavras, intermediar a relação da criança com as descobertas. A criança vê ou ouve algo novo, faz perguntas, ouve respostas, recebe ensinamentos e assim vai se preparando para a vida adulta. Parece até simples, mas dá trabalho. Principalmente porque a realidade vai colocando diante da criança uma série de coisas com as quais os pais devem ajudá-la a lidar, diferenciando, por exemplo, o certo do errado. Mais confortável seria se nada de “ruim” estivesse pelo caminho. E ao ir removendo esses pequenos obstáculos os adultos vão criando uma bolha de plástico em que talvez eles próprios preferissem viver.

Doar é melhor do que acumular


Um programa que sempre me impressiona é o Cada Coisa em Seu Lugar, do Discovery Home & Health, na TV paga. A equipe de decoradores e especialistas em organização entra na casa para colocar em ordem situações muitas vezes caóticas. Trambolhos, como copiadoras, no meio do caminho, salas em que não há lugar para sentar e quartos de criança em que é preciso andar sobre os brinquedos são comuns.

A bagunça tem quase invariavelmente a mesma origem: a mania compulsiva dos donos da casa de acumular quinquilharia. Diante da necessidade de se desfazer da maioria delas, eles resistem e quase sempre recorrem ao suposto valor afetivo das peças. Ou contam histórias que incluem um preço irresistível, uma compra por impulso e a opção por acumular mais um bem, mesmo depois que a inutilidade do que foi adquirido fica mais do que comprovada. São quinquilheiros com pouca chance de cura, que geralmente contraíram o mal ainda na infância.

Fui criado com o costume de regularmente separar as roupas que não usava mais para doar a quem precisava. Até hoje organizo o que vai para doação a cada mudança de estação: se constato que não uso aquela roupa há tempo suficiente para praticamente esquecer que ela está no armário, é hora de passá-la a alguém que possa fazer melhor proveito.

Também fico irritado ao constatar que um eletrodoméstico ou um cobertor, por exemplo, estão apenas ocupando espaço. Não consigo depositar valor afetivo na maioria dos objetos nem pensar que "um dia, quem sabe", o que está encostado será útil. Tudo bem que você gastou dinheiro naquilo, mas transformá-lo em depósito de poeira não vai pagar o que foi investido. É melhor assumir o erro do que torná-lo permanente.

Já há algum tempo venho ensaiando introduzir meu filho nessa mesma filosofia, estimulando-o a separar brinquedos para doação. Agora ele tem seis anos e pode compreender melhor a iniciativa, sem achar que simplesmente estou querendo arrancar coisas dele.

Uma boa oportunidade para levar a cabo meu plano é a campanha lançada ontem pela Disney, que acompanha o lançamento do novo Toy Story. Mais de 500 postos em todo o Brasil vão coletar brinquedos doados, que serão entregues pela Fundação Abrinq e pela ONG internacional Save The Children. A campanha vai até o dia 15 de julho e conta com o apoio do Destak. Para saber onde doar, veja o site www.disney.com.br.

O reforço dos personagens da Disney deve me ajudar na missão de não deixar que meu filho vire um quinquilheiro.

Chefe doente gera chefe doente




Um estudo do National Institute for Health and Clinical Excellence do Reino Unido, publicado ontem pelo Destak, alerta para um problema que muita gente sente na pele: a postura negativa dos chefes no trabalho representa grande risco à saúde mental dos empregados.

Segundo o instituto, doenças como estresse, ansiedade e depressão associadas ao trabalho custam por ano mais de US$ 46 bilhões. O prejuízo vem das faltas no trabalho e da queda de produtividade. Para os pesquisadores, "medidas simples", como um comentário positivo após um trabalho bem-feito e recompensas por bom desempenho, podem reduzir a incidência dessas doenças.

No entanto, quem já viveu um pouco do mundo corporativo sabe que o problema, além de muito antigo, não é nada simples, especialmente em um país com tradição de relações autoritárias como o Brasil.

Apesar da modernização das ferramentas de gestão, ainda prevalece, mesmo que de forma inconsciente, a ideia de que ser chefe é ter o direito de mandar. A quem tem algum juízo, cabe obedecer e, naturalmente, passar os anos nutrindo a esperança de um dia ocupar uma posição de poder. Aí será a sua vez de mandar, do que jeito que bem entender. E carregando os efeitos nocivos do estresse vivido antes.

Assim, cria-se o ciclo vicioso em que os profissionais tendem a reproduzir o comportamento doentio de chefes ruins com quem trabalharam, simplesmente porque a empresa lhes outorgou esse direito ou, então, porque incorporaram práticas autoritárias e negativas como corretas. Se dava certo (ou dava resultados) com o meu chefe, vai dar certo comigo.

Fica claro, portanto, que essa bola está no campo das empresas. São principalmente elas que podem mudar essa realidade, criando políticas internas de respeito às pessoas e, como recomenda o próprio instituto que fez a pesquisa no Reino Unido, investindo no treinamento de seus gestores. Se, ao longo da carreira, eles tiveram poucas oportunidades de aprender a como lidar com as pessoas - o que, na verdade, deveria ser parte fundamental da formação de qualquer um com aspirações a cargo de chefia -, nunca é tarde para começar.

As corporações precisam abrir mão da visão míope dos resultados de curto prazo, obtidos a qualquer preço e até com perda de dinheiro, que entra por um lado e sai por outro. O investimento nas pessoas é de longo prazo, mas pode trazer sucesso duradouro, como atestam especialistas e empresas que adotaram esse caminho.